Por Pe. Gottardo,SJ
Natal é sinal/sinônimo de genuína alegria. “Não tenhais medo: Eis que vos anuncio uma grande alegria, que será para todo o povo: Nasceu-vos, hoje, um Salvador, que é Cristo-Senhor, na cidade de Davi!” (cf. Lc 2,10-11). “Deus nunca perturba a alegria dos seus filhos se não for para lhes preparar uma mais certa e maior” (A. Manzoni). Fato desconcertante: “O Filho de Deus não quis nascer num palácio com tudo o que lhe pertence em pompa e glória. Não preferiu um templo com seus ritos, incensos, velas acesas e cânticos” (L. Boff).
Alberto Caeiro (pseudônimo de Fernando Pessoa) escreveu uma poesia magistral sobre o Menino Jesus, onde exprime a ternura, o encantamento e as estripulias do Menino-Deus, “criança tão humana que é divina”. Ele nasceu para confundir os poderosos deste mundo e para elevar os humildes; ele veio para esvaziar a vã teologia do poder religioso; ele veio para perturbar as consciências entorpecidas; veio para arrancar-nos da zona de conforto. Tomo a liberdade de pinçar algumas frases para o nosso propósito.
Ao contemplar o Menino no Presépio o insigne poeta reconheceu tratar-se de “uma criança bonita de riso e natural”. Por Ele ter se tornado um de nós e feito do mundo Sua casa, através da Encarnação do Verbo (Jo 1,14), não foi difícil para o eminente português, concluir: “Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro. Ele é a Eterna Criança, o Deus que faltava. Ele é o humano que é natural. Ele é o divino que sorri e que brinca. E por isso é que eu sei com toda a certeza que ele é o Menino Jesus verdadeiro”. Ele mostra/demonstra a imagem do Deus invisível.
“Ele sorri porque tudo é incrível” no mundo das ideologias e do modo de proceder dos homens. “Ele Ri dos reis e dos que não são reis, e tem pena de ouvir falar das guerras, e dos comércios…”, do consumismo desenfreado e do folclore que se faz, usando e abusando do Nome dele. Quantos espetáculos circenses acontecem com as festas religiosas! Que dizer da cultura do neopaganismo representada pelo fantoche Papai Noel! Quantas aberrações! Há algo intrigante e dramático na narrativa do nascimento de Jesus: “Ele veio para o que era seu e os seus não o receberam” (cf. Jo 1,11). E ele continua sendo rejeitado por tanta gente! Efetivamente ele imergiu no mundo das trevas do pecado, mas não foi acolhido; mas a Luz é invencível. Com Ele aprendemos que é mais interessante e inteligente acender luzes que maldizer as trevas.
Não obstante o encanto e a beleza inigualável da Divina criança, e ser herdeiro de todas as coisas (cf. Heb 1,2), tornou-se sinal de contradição (cf. Lc 2,34-35). Sua mensagem faz arder o coração. Natal significa nascer do Alto. Quando nasce uma criança os anjos cantam e a vida muda, tudo se torna novo e diferente. Jesus é o símbolo do novo. Ele é o vinho novo. Sua vida será uma explosão de novidade: encarna uma nova imagem de Deus, uma nova maneira de crer, uma nova maneira de se relacionar com as pessoas e com os mais pobres, uma nova maneira de relacionar-se com Deus (Pai): veio para fazer novas todas as coisas (cf. Ap 21,5), veio para incendiar o mundo com o fogo do amor e da misericórdia. A própria etimologia do substantivo evangelho é indicativa: “Boa Notícia”. Portanto, Natal acontece na nossa/minha vida quando permitimos que algo novo nasça em nós.
Humano assim como Jesus só Deus mesmo. Da Manjedoura, aprendemos que “o Deus que se fez criança não julga nem condena ninguém. Quer apenas, como criança, ser acolhido mais que acolher, ser ajudado mais que ajudar” (L. Boff). Por amor, humanizou-se para nos divinizar. “Ele dorme dentro da minha alma e às vezes acorda de noite e brinca com os meus sonhos”. É digno de ser amado sobre todas as coisas porque “ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores…”. Deus não se vê, reconhece-se.
Do Menino do Presépio emana o cheiro do Céu. Trouxe-nos o bom e inconfundível perfume de Deus. Por isso, “quando eu morrer, filhinho, seja eu a criança, o mais pequeno. Pega-me tu ao colo e leva-me para dentro da tua casa”. Descansar no colo de Deus é o anseio mais profundo da alma: “Despe o meu ser cansado e humano e deita-me na tua cama”.
Que o nascimento do Menino-Deus encha o teu coração de alegria e o perturbe hoje, e sempre! Feliz e santo Natal!