Pe. Gottardo,SJ
Segue uma modesta meditação – a partir do evangelho de Marcos 8,27-35 – sobre as implicações do seguimento do Profeta de Nazaré. Acompanhar Jesus e obedecer seus “comandos” não é moleza! O apóstolo Pedro que o diga. No entanto, Ele não engana nem enrola ninguém. Às vezes, suas palavras nos fazem tremer, especialmente, àqueles/as que estão acostumados com uma religião pasteurizada e inofensiva.
Quanto mais aprofundamos no “mistério da fé” e no entendimento de que “Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo”, mais devemos ser capazes de aceitar os riscos de sermos seus “amigos e companheiros”. Muitas vezes, as consequências são desconcertantes, cansativas, difíceis e insidiosas. Jesus ensina com autoridade e a partir da própria experiência sem meias verdades. “Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de mim” (cf. Mt 5,11).
- Quem crê vai sofrer muito. Paga-se um alto preço. Por aquilo que dá sentido à vida, pode ser requerida a vida. É o que aconteceu com o servo do Senhor: “Aos que me feriam, apresentei as espáduas, e as faces àqueles que me arrancavam a barba; não desviei o rosto dos ultrajes e das cusparadas” (cf. Is 50,6). De modo paradoxal o amor se manifesta com todo o seu esplendor no suplício da cruz. Em Jesus há uma certeza inabalável: “Aquele que me fará justiça está comigo”.
- Quem crê será rejeitado. Àquilo que realmente importa, muitas vezes nos condena à rejeição, ao desprezo, à impopularidade e à humilhação. A busca do aplauso, da estima incondicional e da proteção pode ser apenas uma bolha de sabão.
- Quem crê está com a cabeça à prêmio. Quem pensa corre riscos. Quem tem a coragem de expressar-se se arrisca. Quem ousa expressar as próprias convicções pode ser detido e escavar a própria sepultura. O mundo não suporta a Verdade.
- No entanto, quem tem a coragem de perseverar até o fim conhecerá a alegria da Ressurreição, “porque o Senhor protege os pequenos e salva os miseráveis”. O resultado do martírio é a Vida, inesperada e surpreendente. Os ossos secos e tidos definitivamente derrotados, recobrarão vida e serão cobertos com carne e nervos. Criando assombro e alegria (cf. Ez 37).
Pensemos cuidadosamente na pessoa de Pedro. Por que Jesus, imediatamente, após a profissão solene de fé, identifica-o como sendo Satanás? O motivo é apenas um. Pedro quer convencer Jesus a “evadir-se” do caminho que o conduzirá fatalmente à cruz. Ele insinua um percurso muito mais fácil, previsível e cômodo. O pensar dos homens, e não o de Deus, leva Pedro à absoluta alienação da mente e do coração. Que mentalidade mundana a de Pedro! Foi duramente reprovado por Jesus.
Jesus pensa e vive de um jeito diferente. Ele explicitamente diz: “Quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á”. A vida é um dom para ser doado e compartilhado. Caso contrário, torna-se um brinquedo que se brinca enquanto interessa e dá prazer; depois se despreza e se joga fora. É o que vemos e padecemos no mundo, todos os dias e em muitas situações complexas e/ou normais. Feliz é quem gasta a vida, “em tudo amando e servindo” sem descanso e sem falsas expectativas. Quanto mais nos doamos, mais nos enriquecemos: “O verdadeiro amor nunca se desgasta. Quanto mais se dá mais se tem” (Saint-Exupéry).
Aqueles que preservam a vida egoisticamente não veem nada além do próprio umbigo. O campo de visão deles é restrito e tende a desaparecer. É fato: Jesus não possuía nada; por isso mesmo podia acolher cada gesto de atenção que vinha dos outros. Sabia identificar as atitudes que revelam o perfume da bondade de Deus com imensa gratidão. Não desanimava diante dos desafios mesmo não havendo lugar onde reclinar a cabeça. Tinha consciência de que a vida não lhe pertencia. Não se escondia atrás de máscaras nem se apegava a nada. Homem livre e autônomo, não se acovardava nem falava para agradar plateias sedentas por novidades. Dispor-se a dar a própria vida é sinônimo de grandeza d’alma, da máxima expressão da glória de Deus e sinal inequívoco de uma fé autêntica. A fé, sem as obras de misericórdia em si mesma está morta. É estéril. É uma árvore seca.
“Se alguém me quer seguir, renuncie-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (cf. Mc 8,34). Eu quero seguir a Jesus, mas como sou miserável e inconsequente! Seguir Jesus implica em escolher o caminho daqueles que se negam a si mesmos, sem se deixar corroer pela ambição, presunção, arrogância. Negar-se a si mesmo para ser capaz de carregar a cruz todos os dias, sem murmurar. A cruz dos próprios pecados/vícios, das tristezas, dos fracassos, dos medos, das derrotas, dos fantasmas. Importa seguir Jesus com liberdade interior e de modo despojado, como o homem ferido que se confiou inteiramente nas mãos do bom e misericordioso Samaritano (cf. Lc 10,29-37). Isto pode dar a impressão de absoluta inutilidade, mas em assim se vivendo tornamo-nos instrumentos mais efetivos nas mãos de Deus. Ele nos acolhe em nossa fraqueza, para confundir os poderosos deste mundo.
Senhor Jesus, às vezes, sou voluntarista e sinto-me como Pedro. Custa-me ser um discípulo dócil, sensato e confiável, porque sou uma pessoa orgulhosa, alguém que tem a presunção de ensinar-lhe o caminho certo talvez para escapar da perseguição, do sofrimento e da cruz; sou alguém que procura ser “politicamente correto” para alcançar o sucesso, o prestígio do mundo, a tranquilidade, a vida boa e confortável. Como é boa a zona de conforto! Tens razão ao dizer-me, na cara: “Afasta-te de mim, Satanás; atrás de mim”. Ajuda-me a não ser o oposto daquilo que vês e pensas de mim.
Senhor, aumenta a minha fé. Quero acolher e aceitar a missão que me confiaste, com alegria. Quero seguir as Tuas pegadas e perseverar até o fim. Quero um dia poder afirmar, com Paulo: “já não sou eu que vivo, mas Cristo Jesus vive em mim” (cf. Gl 2,20). Converta-me, Senhor.